
Constou numa série de jornais, nos Estados Unidos e não só, uma notícia da Associated Press que conta a história de Maria, uma texana de Houston que envenenou as suas filhas e uma sobrinha, felizmente sem consequências fatais, com um «mezinha» tradicional.O «medicamento» em causa é a greta que os curanderos mexicanos garantem ser quasi uma panaceia, que supostamente cura hiperactividade em crianças, empacho ( aflições intestinais) e problemas estomacais, e que na realidade envenena quem a ingere já que é composta quase exclusivamente (cerca de 80%) por óxidos de chumbo.Existem outros componentes da «farmacopeia» tradicional mexicana que são essencialmente compostos de chumbo como o azarcon, conhecido igualmente como Rueda, Coral, Maria Luisa, Alarcon ou Liga. Os sintomas do envenenamento com chumbo podem passar facilmente despercebidos, na realidade confundem-se com os sintomas das doenças que as «mezinhas» pretendem tratar, e, se não se fizerem testes específicos, são difíceis de despistar já que muitas vezes se resumem a cansaço, sonolência e dores de estomâgo.Os departamentos de saúde um pouco por todo o território norte-americano indicam que as «medicinas» tradicionais utilizadas por emigrantes da América Latina, India e outras partes da Ásia, são a segunda maior causa de envenamento com chumbo - só ultrapassado por envenenamentos causados por tintas antigas que ainda contenham pigmentos deste metal pesado - e podem ser responsáveis por dezenas de milhares de casos análogos aos das crianças de Maria todos os anos.Entre as «farmacopeias» tradicionais mais perigosas em termos de metais pesados encontra-se a usada na «medicina» ayurvédica, para cuja toxicidade o número de Dezembro de 2004 do Journal of the American Medical Association já tinha alertado. O estudo indicava que um em 5 dos «medicamentos» ayurvédicos vendidos na zona de Boston continha níveis elevados de chumbo, mercúrio e/ou arsénio. Como notam os autores, a tradição ayurvédica atribui um papel terapêutico importante ao mercúrio e ao chumbo e pelo menos um destes metais entra na composição de cerca de 35-40% das suas formulações.Os autores concluiram na altura que podem estar em risco de envenenamento com metais pesados os utilizadores desta «medicina» tradicional, muito em voga entre New Agers e vendedores de banha da cobra, que tem em Deepak Chopra, o «curador» quântico, um dos seus grandes divulgadores. Assim, recomendam que seja mandatório o teste dos ditos produtos, normalmente vendidos como produtos herbais.De facto, enquanto a indústria farmacêutica só pode comercializar um produto após rigorosos e demorados testes, os produtos das «medicinas» alternativas não estão sujeitos a qualquer tipo de controle, teste ou regulamentação. Aliás, os produtos «naturais» estão isentos de testes, qualquer que seja o fim a que se destinam, medicamentos, cosméticos ou pesticidas.Existem inúmeros exemplos de medicamentos extraídos ou derivados de produtos encontrados na Natureza. Mas mesmo na bula da vulgar aspirina, o ácido acetilsalicílico que substituiu o (mais tóxico) ácido salícilico em que se transforma no organismo humano a salicilina da casca do salgueiro, encontramos uma longa descrição de todos os seus possíveis efeitos secundários e das suas contra-indicações. As banhas da cobra «terapêuticas» são publicitadas com descrições delirantes sobre as suas inúmeras e impossíveis benesses e nunca apresentam nem efeitos secundários nem contra-indicações.Numa altura em que a Direcção Geral de Saúde mantém a ASAE tão atarefada em inspecções sanitárias sortidas, interrogo-me porque razão a gastronomia tradicional é um alvo preferencial e ninguém sequer menciona as «medicinas» alternativas, tradicionais ou não, que infestam até locais insuspeitos como farmácias, impertubadas e impertubáveis por regulamentação ou testes...
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